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segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Skate Olimpico: representação de fato e oportunismo de direito

Por Edu Mello, em 25/1/2017*

Fonte - http://nucleoskatedf.tumblr.com/post/156366745795/skate-ol%C3%ADmpico-representa%C3%A7%C3%A3o-de-fato-e

Patins sobre rodas não é esporte olímpico. Hóquei sobre rodas também não. Fizeram de tudo até hoje e não conseguiram incluir essas modalidades nas Olimpíadas e, pelo visto, a inclusão é improvável em um futuro próximo.

Nada sei sobre o assunto, não é minha opinião, quem diz é o vice-presidente da Confederação Brasileira de Hóquei e Patinação (CBHP), o senhor Flávio Moreira.

Em entrevista concedida ao site Tudo e Todas ¹, Moreira, admite que o esporte não tem chance e disse que o principal motivo é o fato de a patinação no gelo integrar os Jogos Olímpicos de Inverno e as modalidades sobre rodas serem consideradas variações desses esportes.

Enquanto patinadores e “hoqueiros” não são chamados para o baile, o skate entra pela porta da frente com status de rockstar. Estará em Tóquio junto com seu irmão mais velho, o surfe, com a missão de renovar a audiência dos Jogos Olímpicos.

Com a introdução dessas modalidades de ação no programa oficial, o Comitê Olímpico Internacional (COI) pretende rejuvenescer os ares e abrir horizontes para novos canais de patrocínios. A decisão dos cartolas olímpicos não se deu à toa. As competições de skate e surfe atraem espectadores e movimentam altas cifras no mundo inteiro.

A Street League e o circuito da World Surf League contam com vultosos investimentos. A entrada e a consolidação dos patrocínios das grandes corporações nesses mercados como Nike, Samsung, Audi, Ambev, Casio, Target e Adidas conferem às modalidades status de maior destaque. Há evidente interesse econômico, tratam-se de mercados sólidos e estáveis.

Na contramão desse processo, o Comitê Olímpico do Brasil (COB) ignorou os fatores que motivaram o COI a inserir as citadas modalidades no programa de Tóquio 2020 e indicou a CBHP para administrar o skate brasileiro rumo ao Japão. Tudo leva a crer que sobre a decisão do COB pesaram questões políticas e burocráticas.

A entidade garante ser a representante legal e afirma que vai tocar o skate rumo a Tóquio. Em comunicado publicado nos veículos oficiais da entidade², o presidente Moacyr Neuenschwander Junior questiona a contestação feita pela CBSK na internet e diz que a campanha dos skatistas tem “propósitos escusos”.

O senhor Neuenschwander deveria ser mais cuidadoso em suas declarações, apontar nomes e expor quem tem interesses anti-olímpicos. Quem tem razão nessa queda de braço? A CBSK, entidade que publicamente trabalha pelo skate desde 1999 ou a CBHP que incluiu a modalidade em seu estatuto às pressas³, durante reunião realizada semana passada (mais precisamente dia 21 de janeiro de 2017)?

Vale ressaltar ainda que no estatuto vigente⁴, registrado em 2009, a CBHP não menciona a palavra skate. A modalidade sequer é citada em rodapé. Nem entre aspas aparece! Há, portanto, um evidente gap de representatividade de, no mínimo, 18 anos entre a atuação comprovada da CBSK e a inexistência do skate entre as responsabilidades estatutárias da CBHP.

Não questiono a autoridade da entidade sobre hóquei e patinação. A CBHP está coberta de razão: é “a única gestora de todos os esportes sobre rodas e afins abrigados pela FIRS (Fédération Internationale de Roller Sports), pelo COI e pelo COB”. Sobre o skate, não tem representatividade alguma. Não adianta inventar vínculos, todos sabem que é zero.

Mas, por que tanta insistência? Os reais motivos para o presidente dos patinadores querer a gestão do skate ficaram claros no balanço⁵ publicado por ele nos veículos oficiais da confederação.

O interesse maior da CBHP é ser reconhecida como entidade olímpica, mesmo que não tenha contribuído para desempenhar esse protagonismo. A confederação não tem méritos (nem conhecimentos técnicos) para planejar e executar o ciclo olímpico do skate, que cresceu sem quaisquer interferências dela.

De acordo com o presidente Moacyr Junior, a gestão sobre o skate é importante porque trará “muitas novas oportunidades para toda a família da CBHP, através de uma maior visibilidade e exposição midiática, o que certamente refletirá de forma positiva em todas as modalidades”.

Falando em bom português, o que importa para esse cartola é ter um desejado ciclo olímpico nas mãos. O que importa são patins e hóquei. O skate é mero instrumento.

No comunicado, Neuenschwander informa ainda que a CBHP é filiada a FIRS, que por mais de 12 anos tentou colocar os esportes sobre rodas nos Jogos Olímpicos, mas não citou o skate uma só vez.

Evidente está que a CBHP quer o skateboard para ir às olimpíadas e saciar vaidades históricas. Seu dirigente está enganado: de carona, não vai.

Até essa polêmica vir à tona, o grande público sequer sabia da existência da CBHP. Não há força política em quem não é lembrado. Lanço um desafio para reforçar minha tese: indiquem UM nome de patinador ou jogador de hóquei de quaisquer sexo, idade e época que marcaram o nome entre os esportistas brasileiros. No mundo nem precisa citar, fiquemos na esfera doméstica, seria covardia da minha parte. Para sacramentar, deixo vocês recorrerem ao Google, mas adianto para poupar o precioso tempo de vocês que não encontrarão UM sequer.

Do nosso lado a coisa é diferente. Temos skatistas reconhecidos de sobra, a começar por Pedro Barros, indicado ao Laureus World Sports Awards 2017. Pedrinho, campeão mundial já externou publicamente sua indignação⁶ com a interferência da CBHP no skate. Outros nomes com o mesmo peso do catarinense engrossam o coro como Letícia Bufoni, Bob Burnquist, Sandro Dias, Luan Oliveira e tantos outros. A fila é enorme, tem mais de 8,5 milhões de skatistas⁷ anônimos por eles representados.

A equação é simples. Eles não têm entre seus confederados um praticante de ponta, um expoente internacional. São apenas burocratas agarrados em ações entre amigos. Não são os representantes de fato. Conosco estão os melhores do mundo, que fazem bonito há décadas e dedicaram suas vidas ao skate.

Nunca terão a nossa aprovação, desistam. Seguirão sem o reconhecimento público e sem a representação de fato: mais cedo ou mais tarde, o atento presidente do COB, Carlos Arthur Nuzman, vai colocar isso na balança. Para piorar a situação de quem está sentado do outro lado da mesa, é possível que o Nuzman perceba, ainda que tardiamente, a irregularidade na nomeação da CBHP feita pelo COB, que concedeu responsabilidade sobre o ciclo olímpico do skate a um grupo que não tem a modalidade incluída ao estatuto vigente (registrado em 2009).

Dessa maneira, fica evidente que o presidente Moacyr Junior errou ao afirmar em “Nota de Esclarecimento”⁸ que “a CBHP é a única gestora de todos os esportes sobre rodas por ela abrigados, inclusive o skate, desde sua fundação e reconhecimento pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil) há mais de 30 anos”. Está errado e o estatuto da confederação está aí para desmenti-lo a qualquer momento.

Se os skatistas nada fizeram para o skate estar nas olimpíadas, como o presidente da CBHP disse em entrevista ao Blog “Laguna Olímpico” do Lance!⁹, isso só diz respeito a nós, skatistas.

Se vocês, patinadores e “hoqueiros”, são rejeitados a cada quatro anos pelo COI, não banquem os espertos. Vocês não representam o skateboard de fato, buscaremos todos os meios para sermos também os representantes de direito durante o ciclo olímpico e nos Jogos de Tóquio.

* Edu Mello é skatista, coordenador do Núcleo Escola de Skateboard Brasília, diretor executivo da Federação de Skateboard do Distrito Federal e jornalista.

LINKS:

¹ Tudo e Todas
http://www.tudoetodas.com.br/post/entenda-porque-a-patinacao-sobre-rodas-nao-e-um-esporte-olimpico

² COMUNICADO SOBRE A MODALIDADE SKATE
https://www.cbhp.com.br/site/wp-content/uploads/2017/01/Comunicado_CBHP-PRES_01-2017-.pdf

³ ESTATUTO CBHP 2017 (em processo de registro)
https://www.cbhp.com.br/site/wp-content/uploads/2017/01/Estatuto-CBHP-2017-Janeiro_2017.pdf

⁴ ESTATUTO CBHP REGISTRADO (2009, em vigor até a presente data)
https://www.cbhp.com.br/arquivos/2013/INSTITUCIONAL/ESTATUTO–CBHP-2009-REGISTRADO.pdf

⁵ COMUNICADO “PALAVRA DO PRESIDENTE”
https://www.cbhp.com.br/site/wp-content/uploads/2016/12/Palavra-do-Presidente-2016.pdf

⁶ Pedro Barros ameaça boicotar Tóquio 2020
http://globotv.globo.com/sportv/sportvnews/v/skatista-pedro-barros-ameaca-nao-ir-aos-jogos-de-toquio/5594515/

⁷ PESQUISA DATAFOLHA
http://triboskate.ativo.com/datafolha-atualiza-para-85-milhoes-o-numero-de-skatistas-no-brasil/

⁸ NOTA DE ESCLARECIMENTO
https://www.cbhp.com.br/site/wp-content/uploads/2017/01/Nota-de-Esclarecimento_CBHP-.pdf

⁹ ENTREVISTA JORNAL LANCE! (BLOG LAGUNA OLÍMPICO) – “O skate nunca fez nada para ser olímpico”
http://blogs.lance.com.br/laguna-olimpico/polemica-skate-olimpico-brasil/

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